EXERCÍCIOS


PREZADOS ALUNOS
“Minha vida de menina”  pode ser novidade na Fuvest, mas já foi cobrada pela UFMG e pelo Enem. Vejam três questões que garimpei para vocês:

(UFMG) Todas as seguintes afirmativas relacionadas a MINHA VIDA DE MENINA, de Helena Morley, estão corretas, EXCETO
a) Constitui um texto marcado por uma postura juvenil, crítica e irônica.
b) Foi escrito sem propósito de publicação, num estilo despojado e franco.
c) Organiza-se como um documento de fatos ligados à libertação dos escravos em Minas.
d) Trata-se de um diário que menciona acontecimentos político-sociais da época.
A obra em questão — um diário elaborado por uma adolescente, no final do século XIX —, de fato, é marcada “por uma posição juvenil, crítica e irônica”, talvez até mesmo por ter sido escrita sem qualquer “propósito de publicação, num estilo despojado e franco”. Isso elimina as duas primeiras alternativas. Assim como a autora apenas “menciona acontecimentos político-sociais da época”, mantém a mesma postura em relação à “libertação dos escravos em Minas”. Assim, a alternativa C, por conduzir uma afirmação equivocada, é a correta.  

(UFMG) Todas as alternativas apresentam aspectos comuns a MINHA VIDA DE MENINA e a MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS, EXCETO
a) A existência de narradores pessimistas quanto ao destino das personagens.
b) A ocorrência de antagonismos de classe no meio social dos narradores.
c) A opção por gêneros literários em que o registro do tempo é um fator decisivo.
d) O uso de uma escrita fragmentada na constituição das narrativas.
Quando uma questão pede comparação entre obras é preciso redobrar a atenção! Vejamos: Brás Cubas é um narrador pessimista (lembremos do famoso epílogo: “... não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria.”), mas Helena projeta uma vida plena, no tempo em que escreve e também quando olha para o futuro. Muitas vezes durante a obra revolta-se com a postura da mãe, que entende a vida como “sofrimento”.   Por estar parcialmente correta, a alternativa A não contempla o enunciado, que pede “aspectos comuns” às duas obras.

É preciso ter muito cuidado quando um teste solicita a alternativa “incorreta” ou utiliza um termo como “exceto”, em seu enunciado. Estamos sempre mais preparados para assinalar alternativas com afirmações corretas. Mas, como vimos aqui, a alternativa correta, em algumas formulações, deve ser a que contem a afirmação incorreta.

(ENEM  2009)
Terça–feira, 30 de maio de 1893.

Eu gosto muito de todas as festas de Diamantina; mas quando são na igreja do Rosário, que é quase pegada à chácara de vovó, eu gosto ainda mais. Até parece que a festa é nossa. E este ano foi mesmo. Foi sorteada para rainha do Rosário uma ex–escrava de vovó chamada Júlia e para rei um negro muito entusiasmado que eu não conhecia. Coitada de Júlia! Ela vinha há muito tempo ajuntando dinheiro para comprar um rancho. Gastou tudo na festa e ainda ficou devendo. Agora é que eu vi como fica caro para os pobres dos negros serem reis por um dia. Júlia com o vestido e a coroa já gastou muito. Além disso, teve de dar um jantar para a corte toda. A rainha tem uma caudatária que vai atrás segurando na capa que tem uma grande cauda. Esta também é negra da chácara e ajudou no jantar. Eu acho graça é no entusiasmo dos pretos neste reinado tão curto. Ninguém rejeita o cargo, mesmo sabendo a despesa que dá!
MORLEY, Helena. Minha vida de menina. São Paulo: Companhia das Letras, 1998, p. 57.


O trecho acima apresenta marcas textuais que justificam o emprego da linguagem coloquial. O tom informal do discurso se deve ao fato de que se trata de
a) uma narrativa regionalista, que procura reproduzir as características mais típicas da região, como as falas dos personagens e o contexto social a que pertencem.
b) uma carta pessoal, escrita pela autora e endereçada a um destinatário específico, com o qual ela tem intimidade suficiente para suprimir as formalidades da correspondência oficial.
c) um registro no diário da autora, conforme indicam a data, o emprego da primeira pessoa, a expressão de reflexões pessoais e a ausência de uma intenção literária explícita na escrita.
d) uma narrativa de memórias, na qual a grande distância temporal entre o momento da escrita e o fato narrado impõe o tom informal, pois a autora tem dificuldade de se lembrar com exatidão dos acontecimentos narrados.
e) uma narrativa oral, em que a autora deve escrever como se estivesse falando para um interlocutor, isto é, sem se preocupar com a norma padrão da língua portuguesa e com referências exatas aos acontecimentos mencionados.

Trata-se de uma questão que explora o gênero a partir de suas características formais. Dentro desse âmbito, a alternativa C define bem os escritos de Helena Morley. Quem estudou a obra sabe que Helena não premedita registros com características da fala ou do contexto social de sua região, como se afirma em A, assim como, a princípio, a autora não demonstra qualquer preocupação com um interlocutor  externo, como se anuncia em E. Uma de suas intenções é, como se lê em D, desenvolver uma narrativa de memória, mas o faz sem “grande distância temporal entre o momento da escrita e o fato narrado”. 

SEGUEM ALGUNS DOS EXERCÍCIOS DO CADERNO OBRAS LITERÁRIAS FUVEST 2018
1.       “Em pequena meu pai me fez tomar o hábito de escrever o que sucedia comigo. Na Escola Normal o Professor de Português exigia das alunas uma composição quase diária, que chamávamos "redação" e que podia ser, à nossa escolha, uma descrição, ou carta ou narração do que se dava com cada uma. Eu achava mais fácil escrever o que se passava em torno de mim e entre a nossa família, muito numerosa. Esses escritos, que enchem muitos cadernos e folhas avulsas, andaram anos e anos guardados, esquecidos. Ultimamente pus-me a revê-los e ordená-los para os meus, principalmente para minhas netas. Nasceu daí a ideia, com que me conformei, de um livro que mostrasse às meninas de hoje a diferença entre a vida atual e a existência simples que levávamos naquela época.”

A partir da passagem citada, selecione a opção que melhor define a intenção da autora ao escrever um diário:
a)      Registrar fatos e acontecimentos importantes sucedidos em Diamantina na época do declínio da mineração como documento para a posteridade.
b)      Ampliar o conhecimento da língua portuguesa e desenvolver a habilidade de escrita para assumir um cargo de professora quando terminasse a Escola Normal.
c)       Narrar acontecimentos íntimos que não queria dividir com outras pessoas e deixá-los anotados para que não se perdessem na memória.
d)      Transmitir seu modo de vida e suas histórias para suas netas e para as meninas das gerações futuras.
Apesar de muitas situações que se leem nas alternativas A, B e D terem se tornado realidade, após décadas, sabemos, pelo excerto dado, que Helena, na época em que escrevia, não tinha a intenção de registrar fatos importantes no período do declínio da mineração, nem mesmo de se especializar em língua portuguesa ou de ser uma escritora dedicada às suas netas e aos seus futuros leitores. O diário se enquadra melhor no que se afirma em C.
 
3.    “Segunda-feira, 15 de julho Uma doença demorada, em Diamantina, vira mais uma festa do que outra coisa. Nós, todas as primas, gostamos mais de fazer quarto a doente do que mesmo de novena. A doença de Vieira é um divertimento. Uma amiga minha já arranjou noiva fazendo quarto na casa dele. Ele está doente há um mês- ma para morrer, há uma semana.”

O trecho de Minha vida de menina, de Helena Morley, demonstra como a cidade de Diamantina, Minas Gerais, aparece no diário.
A partir da leitura da obra é possível dizer que:
a)      a cidade torna-se um personagem do livro, pois ganha características humanas ao ser retomada a partir de diferentes ângulos, culturais, políticos e sociais.
b)      a cidade é apresentada como uma região singular, sendo o cenário ideal para as histórias relatadas no livro.
c)       a cidade é descrita como atrasada, ruim, de difícil acesso, preconceituosa e monótona em decorrência da manutenção do sistema colonial.
d)      a cidade é representada como um espelho dos sentimentos e dos estados de humor da autora, podendo ser um lugar belo, feio, alegre, difícil, afetuoso etc.
Em “Uma doença demorada, em Diamantina, vira mais uma festa do que outra coisa.” Fica clara a ideia da jovem autora de apresentar sua cidade natal como singular, especial, diferente das demais, como se afirma em B. O espaço faz parte das situações e acontecimentos registrados no diário, porém não chega a assumir o protagonismo na cena apresentada. Não há também, no trecho, qualquer menção a “atraso, monotonia, dificuldade de acesso” ou a possibilidade de Diamantina ser interpretada como “espelho dos sentimentos da autora”.
5.       “Não sei se poderá interessar ao leitor de hoje a vida corrente de uma cidade do interior, no fim do século passado, através das impressões de uma menina, de uma cidade sem luz elétrica, água canalizada, telefone, nem mesmo padaria, quando se vivia contente com pouco, sem as preocupações de hoje. E como a vida era boa naquele tempo! Quanto desabafo, quantas queixas, quantos casos sobre os tios, as primas, os professores, as colegas e as amigas, coisas de que não poderia mais me lembrar, depois de tantos anos, encontrei agora nos meus cadernos antigos!”
Tendo em vista o trecho citado, retirado da nota à 1ª edição, selecione a opção que melhor caracteriza Minha vida de menina.
a)      Relata a vida na pequena cidade do interior, Diamantina, por meio das histórias de seus cidadãos, da autora e de sua família.
b)      Descreve sentimentos íntimos da autora em relação a questões de sua idade, como mudanças físicas e garotos.
c)       Guarda os sofrimentos e as dificuldades vivenciadas pela autora por não ser compreendida por sua família.
d)      Traz as angústias vividas pela autora em decorrência da situação financeira de sua família.

Ainda que todas as alternativas apresentem características de um diário, o trecho em questão faz menção ao olhar da autora para o entorno, em seu tempo e espaço: “a vida corrente de uma cidade do interior[...],quando se vivia contente com pouco, [...] quantos casos sobre os tios, as primas, os professores, as colegas e as amigas,”. Assim, o que se afirma em A está mais adequado.

8. “Esperei sem poder falar muito, de tanta fome. Chegou a hora do jantar e a negra Maria encarreirou todos os meninos no banco da mesa grande do salão do forno e foi trazendo os pratos feitos para cada um. Quando chega a minha vez Maria vira para mim e pergunta: "Sinhá Helena, ocê também quer janta?". Eu, espantada da pergunta, respondi: "Não, não quero não!" Pensando que a burra entendesse. Espero o meu prato e não vem. Grito a Maria: "Que é do meu prato?". Ela responde: "Uai! Ocê não disse que não queria? Agora não tem mais comida". Fiquei tão pasma que nem pude reclamar. Fiz o que mamãe diz que a gente deve fazer quando o sofrimento é grande: oferecer o sacrifício a Deus que ele agradece e ajuda depois, quando se precisa. Não quis a sobremesa de melado com cará. Não sei se foi para fazer bem o sacrifício ou se foi de raiva. Acabado o jantar vovó olhou para mim e disse: "Você está pálida e de beiços brancos. Que é isto? Está doente?". Eu respondi: "Não senhora. Talvez seja porque eu não merendei nem jantei". Vovó exclamou: "Forte coisa!".”

O trecho é um exemplo da utilização da linguagem oral no diário. Em Minha vida de menina, as expressões orais:
a)    refletem as situações econômica e social vivenciadas por Helena Morley.
b)   determinam a classe social de cada personagem, de modo que a linguagem é alterada de acordo com a situação descrita.
c)    caracterizam a região, o momento histórico e a aproximação aos fatos cotidianos, presentes no texto.
d)   objetivam aproximar a obra de um público mais amplo, de modo a alcançar leitores de todas as classes sociais.
Em “Minha vida de menina”, as expressões orais são frutos da espontaneidade dos registros em determinados tempo e espaço e, naturalmente, promovem uma “aproximação aos fatos cotidianos”, como se afirma em C. As afirmações constantes nas demais alternativas  não condizem com a gênese da obra e com as características da autora, quando a realizou.

9. “Tenho pena das minhas primas com aquele pai tão metódico, como elas dizem. Na casa delas tudo é na hora, tudo é na regra, até palavras, modos, tudo. Engraçado é que as primas vivem horrorizadas de meu pai e mamãe não nos darem educação, como elas dizem, e não fazem um passeio sem nós duas, eu e Luisinha. Mas quando chega de tarde, estou mais cansada do que se estivesse trabalhando o dia inteiro, de tanto fingir de educada perto delas.
Não sei se minhas primas têm pena de mim como eu tenho delas. Com certeza.”

No trecho em destaque, que foi retirado das primeiras páginas de Minha vida de menina, de Helena Morley, e faz parte da narrativa do dia 22 de abril de 1893, podemos dizer que a narradora:
a)      demonstra falta de vontade em conviver com suas primas por causa da educação rígida de seus tios.
b)      traça uma comparação entre a educação dada por seus pais a ela e Luisinha e aquela dada pelos tios às primas.
c)       insinua uma certa inveja das primas por terem os pais mais presentes e mais participantes na educação das filhas.
d)      sente pena das primas por elas não poderem fazer longos passeios como aqueles praticados pela família Morley.

Em relação às primas, no trecho dado, a narradora demonstra “pena” e não “inveja” ou “falta de vontade em conviver”, o que descarta as alternativas A e C. Ao afirmar que as primas não faziam “longos passeios como os da família Morley”, a alternativa D desvia-se do motivo do sentimento anunciado no trecho dado. A alternativa B é a única que lê adequadamente o trecho que, de fato, compara os modelos de educação assumidos pelas famílias mencionadas.

10. Ao leitor de Minha vida de menina fica evidente que Helena Morley convivia com diferentes classes sociais.
A partir dessa afirmação é possível dizer que o livro:
a)    apresenta a luta de poder entre diferentes classes sociais, dado o período histórico em que os relatos ocorrem.
b)   traz as relações familiares de Helena Morley como metonímia das relações entre classes ocorridas no Brasil nesse período.
c)    está desconectado dos eventos históricos ocorridos no Brasil no período em que foi escrito, sendo as relações entre classes sociais inteiramente fictícias.
d)   é um relato da convivência entre brancos e negros num período posterior à Lei Áurea, retratando as ambiguidades existentes nessas relações.
Registrar a luta de classes no Brasil de época não faz parte das intenções da autora, como vimos em questões anteriores. Assim, descartamos as primeiras duas alternativas. Por outro lado (apesar de não apresentar reflexões mais profundas em relação a eventos políticos), não é possível afirmar que o diário de Helena esteja “desconectado dos eventos históricos”, uma vez que muitos fatos mais distantes ou mais próximos de Diamantina, direta ou indiretamente, são mencionados pela jovem escritora. A alternativa D apresenta, de fato, um aspecto correto da obra. O convívio entre brancos e negros, no período mencionado, é comum e, em alguns momentos, os registros da autora revelam as ambiguidades dessa convivência.          




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